Mistérios Japoneses - Escolta de Fuyuki Saji

Já havia escalado bastante, e apesar de preparadas, minhas mãos estavam machucadas, uns ralados, um pouco de sangue... Mas a experiência não podia estar melhor, estava tendo o desafio que procurava. Como não queria que ele terminasse de forma trágica, aproveitei uma pequena região plana, que mal cabia a mim e minha mochila. Me sentei, relaxei os músculos e peguei a garrafa de água da lateral da mochila. Tomei um gole refrescante, e joguei um pouco de água na minha mão, para tirar o lodo vermelho-amarronzado de talco, poeira e sangue. Ergui minha cabeça e olhei para o horizonte, mas em nada prestei atenção, além de meus pensamentos inquietos.
     Começam com lembranças das primeiras escaladas que fiz junto com meu pai, lembro do cuidado, da paciência e da exigência que tinha comigo... Me moldaram no que sou hoje... Depois me indago se meus pais usaram essa rota quando se conheceram, se subiram juntos ou se simplesmente se encontraram no cume ou na base, o que eles conversaram, o que pensaram  quando viram um ao outro... Então me sinto meio ridículo, como quando eu era criança e tinha a vontade gritante de conhecer minha mãe... "Cresça Fuyuki-san, não tem mais idade para isso" eu penso comigo mesmo... Se os melhores detetives de Tóquio não a encontraram, ela deve estar bem escondida... Talvez ela fosse alguém especial, tipo uma agente secreta que teve uma paixão incontrolável por meu pai que resultou em mim, mas como não podia cuidar de mim, me deixou com meu pai.. Ou uma ninja de um clã do submundo, uma assassina cruel que teve noites de prazer e luxúria, mas não conseguiu assassinar o próprio filho, me entregou para meu pai e teve que desaparecer da face da terra... Quem sabe já tinha uma família em outro país, estava de férias, teve um caso, e quando nasci o marido descobriu que a criança não era dele e mandou ela se livrar de mim... Mas acho que estou pintando quadros onde ela não tinha escolha a não ser me deixar, quando a realidade pode ser que ela simplesmente não me queria, nem ao meu pai, nos largou e sumiu... Uma lágrima gelada sai de meu olho direito, percorre todo o meu rosto e cai em meu joelho, me tirando de meu mundo particular, me acordando pra realidade... O sol já estava se pondo, a vista era linda, mas fiquei muito tempo parado.
     Bem recuperado, peguei em minha mochila uma lanterna de testa, e uma de cintura, e as coloquei. Pus a mochila nas costas, talco na mão e retomei a escalada em ritmo acelerado. Deviam ser quase 6 h da tarde, por mais que a paisagem estivesse linda, não poderia ficar parado assistindo, tinha uma missão pra fazer, uma missão pessoal, vencer o monte Fuji. "Será que conseguiria chegar ao topo ainda hoje?" Perguntei a mim mesmo, num tom desafiador, porém confiante. "Com certeza eu posso tentar"...